Ano Paulino (2008-2009)
Ano Paulino
A pouco e pouco, vamos descobrindo como a graça de Deus frutifica, no actual Pontífice da Igreja Católica, Bento XVI, uma esplendorosa irradiação iluminativa de fé, de conhecimento e de santidade apostólica, especialmente para dentro da Igreja.
E uma irradiação também para fora da Igreja, no diálogo com as outras religiões e com o mundo, especialmente na linha de defesa da razão e das relações entre a fé e a razão. Perante o irracionalismo pós-modernista, a voz e a autoridade do Papa Ratzinger tem tido um grande eco.
E o mesmo se diga no diálogo com religiões que têm no seu seio movimentos irracionais de fundamentalismo.
Quem estiver atento às suas palavras e aos seus gestos (felizmente, a Internet dá-nos todos os dias informação acerca disso), descobre um homem de fé e de grande sabedoria, ao mesmo tempo apóstolo ardente e sacrificado; tornam-se evidentes os sacrifícios que faz com as deslocações e as frequentes catequeses e intervenções pastorais e teológicas, inclusive escrevendo livros, além das suas grandes encíclicas de espiritualidade, a primeira sobre o amor e a segunda sobre a esperança, isto é (note-se bem), sobre duas virtudes teologais.
Quem, por fé e reverência para com a divina presença e acção pentecostal na Igreja (como é o caso dos membros do Renovamento Carismático), tiver apreço pelos chamados “novos movimentos e comunidades” da Igreja, não pode deixar de verificar como Bento XVI tem defendido os novos movimentos, inclusive recomendando repetidamente aos Bispos o seu bom acolhimento, que nem sempre ocorre.
Agora, foi surpreendente a escolha do tema desta Jornada Mundial da Juventude, e os termos em que tem sido apresentado e desenvolvido, tema que é manifestamente “carismático”; melhor dizendo, pentecostal. Já em número anterior desta revista destacámos alguns excertos das suas declarações. Recordemos novamente aqui apenas o seguinte breve parágrafo:
“Na minha mensagem por ocasião da próxima Jornada Mundial da Juventude, 2008, propus aos jovens que redescubram a presença do Espírito Santo na sua vida e, portanto, a importância destes sacramentos [do Baptismo e da Confirmação].
Hoje quero ampliar o convite a todos: queridos irmãos e irmãs, redescubramos a beleza de ser baptizados no Espírito Santo; retomemos consciência de nosso Baptismo e da nossa Confirmação, que são mananciais de graça sempre actual. “
A comemoração do Ano Paulino é um convite inspirado do Papa a toda a Igreja.
Trata-se de, ao longo de um ano, dedicar a S. Paulo; às suas cartas e à sua obra apostólica; leitura e meditação, mas também amorosa oração.
O mínimo que poderemos fazer ao longo de um ano inteiro, em minha modesta opinião, é ler, meditar e rezar as cartas de S. Paulo. Pelo menos as sete cartas consideradas pelos estudiosos como por assim dizer principais, ou protopaulinas: 1 Tessalonicenses, 1 e 2 Coríntios, Gálatas, Romanos, Filipenses e Filémon. Mas ainda, e por que não, as outras sete cartas: Efésios, Colossenses, 2 Tessalonicenses e 1 e 2 Timóteo, Tito e Hebreus.
Nada menos do que isto; não creio que, ao povo de Deus, baste meditar ao longo de um ano inteiro, e à base de palavras alheias, ainda que sábias, apenas alguns excertos.
O ensino de S. Paulo é um ensino que lhe foi pessoalmente inspirado por Deus, como ele próprio disse; um “evangelho de Paulo”; e, por isso, a leitura e a meditação das suas cartas é leitura e meditação da “Palavra de Deus”, que é alimento espiritual indispensável e insubstituível.
Hoje, deixemos aqui breves notas de sugestão à leitura da primeira carta aos Tessalonicenses. Sendo considerada provavelmente a primeira carta de S. Paulo, escrita antes mesmo dos 4 Evangelhos, uma nota interessante é que esta carta é dirigida à comunidade dos tessalonicenses por Paulo, Silvano e Timóteo; ou seja, pela “comunidade pastoral” constituída por Paulo e seus companheiros; e não apenas por Paulo.
Trata-se de uma carta cheia de afectos e de preocupação pela comunidade; e cheia de exortações, com referência a Deus Pai (termo repetido 33 vezes), a Jesus Filho (29 alusões) e ao Espírito Santo (4 alusões), que é afirmado como Aquele que transmite força para suportar as perseguições.
Outra nota é a teologia do trabalho; “trabalhar com as próprias mãos”; dirigida a uma comunidade que era maioritariamente de escravos, e de senhores que consideravam o trabalho como apenas de escravos.
É visível uma grande insistência na espiritualidade da perfeição cristã: “rogamo-vos, pois, e exortamo-vos no Senhor Jesus, a que progridais sempre mais”; “mas ainda vos rogamos, irmãos, que vos aperfeiçoeis mais e mais”. Com insistência na pureza de vida (condenando as paixões desregradas), na caridade fraterna, (“vós mesmos aprendestes de Deus a vos amardes uns aos outros”), e na serenidade e trabalho com as próprias mãos.
Paulo ensina nesta carta a teologia da ressurreição: “não queremos que ignoreis coisa alguma a respeito dos mortos, para que não vos entristeçais, como os outros homens que não têm esperança”. “Quando for dado o sinal…o Senhor descerá do céu e os que morreram em Cristo ressurgirão primeiro”. Recomenda a vigilância contínua: “Não durmamos, como os demais, vigiemos e sejamos sóbrios”.
E dá a chave teológica da vida cristã: “Tomemos por couraça a fé e a caridade e por capacete a esperança da salvação”.
Termina com conselhos consoladores: “conservai a paz entre vós”; vivei sempre contentes. Em todas as circunstâncias dai graças”.
Finalmente, e este ensinamento é especialmente grato ao Renovamento carismático; escreve a orientação suprema da vida e do discernimento espiritual: “não extingais o Espírito. Não desprezeis as profecias. Examinai tudo e abraçai o que for bom”.
Poderíamos hoje imaginar tais recomendações às comunidades actuais de católicos?
Mário Pinto
A conversão de Saulo de Tarso
A conversão de Saulo teve um papel crucial na propagação do Evangelho.
A oposição de Saulo aos cristãos, antes da sua conversão, levava à fuga dos primeiros cristãos de Jerusalém, o que por si levava à proliferação do Evangelho para outras regiões, nomeadamente a Judeia e a Samaria (Actos 8, 1, 11, 19-21).
A salvação de Saulo teve como consequência a propagação do Evangelho a pessoas e terras distantes, assim como deu origem ao nascimento da igreja em muitas cidades-chave para a continuidade da evangelização. No processo Saulo levou o Evangelho aos gentios, levando à sua conversão a Jesus. Também as suas cartas foram importantes para o reforço da fé de muitos santos.
Os versos 1 e 2 retratam o intenso desejo e determinação de Saulo para a exterminação dos cristãos, perseguindo-os agressivamente, mesmo os que fugiam de Jerusalém. Contudo, o propósito de Deus prevaleceria: Provérbios 16, 9, “O coração do homem dispõe o seu caminho, mas é o Senhor quem dirige os seus passos.”
Deus iria revelar a Sua Omnipotência usando Saulo para propagar o Evangelho 1º pela sua oposição mas depois pela sua conversão, donde resultou uma poderosa proclamação de Jesus como o Messias.
Sabemos de Actos 22, 6 e 26, 13 que era “meio dia” quando Saulo foi interrompido no seu caminho por uma luz brilhante do céu. E era o brilhante o suficiente para lhe causar uma instantânea cegueira. Sabemos pela Bíblia que esta luz era muito mais que uma luz muito brilhante, era a radiância da glória de Deus.
A cegueira a que Saulo foi sujeito, era também simbólica da sua condição, também Israel estava cego, embora a cegueira de Saulo fosse de certa maneira de um tipo específico: “O Senhor atingir-te-á com vertigens, cegueira e perturbações do espírito. Andarás às apalpadelas em pleno dia, como um cego na escuridão, sem encontrares o caminho, e serás oprimido e espoliado todos os dias sem haver quem te salve” (Deuteronómio 28, 28-29).
Esta cegueira só seria removida pela fé em Cristo, um milagre que só poderia acontecer por acção divina: “Nesse dia, os surdos ouvirão as palavras do livro, e, livres da obscuridade e das trevas, os olhos dos cegos verão” (Isaías 29, 18).
A ponderosa manifestação de Jesus deixou Saulo cego (9, 8), durante 3 dias. Sem ver, comer ou beber (9, 9) até Ananias o procurar. Nessa altura, tipo uma escamas caíram dos seus olhos, e Saulo recuperou a visão e levantando-se foi baptizado (9, 18).
Segundo Gallant, o episódio da conversão de Saulo pode-se comparar com o julgamento, morte e ressurreição de Cristo, e aponta as seguintes observações:
(1) Cristo esteve perante Pilatos como um criminoso, acusado dos crimes de rebelião contra César e de blasfémia.
(2) Jesus foi julgado inocente mas mesmo assim foi condenado à morte.
(3) Jesus foi sepultado, nas trevas…
(4) No 3º dia a pedra da sua sepultura foi removida e Ele manifestou-se na luz da ressurreição VIVO!
Quanto a Saulo:
(1) Esteve perante como um criminoso, acusado pelo Senhor de rebelião e de blasfémia (26, 11 e 1 Timóteo 1, 13).
(2) Foi sentenciado como culpado, e é condenado à morte? Bem ele é:
(3) Enterrado na escuridão durante 3 dias. Esta morte simbólica é reforçada pelo facto de ele nem comer nem beber. Este simbolismo indicia um julgamento e condenação.
(4) No 3º dia no encontro com Ananias o cair das escamas dos olhos pode ser comparado com a remoção da pedra do túmulo de Jesus. Com o baptismo Saulo levanta-se (anastas): emerge/ressuscita para a luz da vida nova em Cristo.
A conversão de Saulo foi muito importante na história da igreja. O mesmo Saulo que desempenhou um papel preponderante na execução de Estêvão tornou-se, em larga medida, no seu substituto. Saulo, como Estêvão, era um judeu helénico; também falava com uma determinação e firmeza que os seus oponentes dificilmente o refutavam; como Estêvão tinha um ministério focalizado nos judeus helenistas; e tal como Estêvão os inimigos do Evangelho intentaram contra a sua vida quando não o conseguiram rebater pelo debate. Fundamentalmente esta conversão esteve directamente ligada ao regresso da paz, versículo 31: “Entretanto, a Igreja gozava de paz por toda a Judeia, Galileia e Samaria, crescia como um edifício e caminhava no temor do Senhor e, com a assistência do Espírito Santo, ia aumentando.”
Digamos como Paulo:
“Bendito seja o Deus,
Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo,
que no alto do Céu nos abençoou
com toda a espécie de bênçãos espirituais
em Cristo.
Ele nos escolheu em Cristo, antes da
fundação do mundo, para sermos santos e
irrepreensíveis,
na sua presença, no amor.
Predestinou-nos para sermos adoptados
como seus filhos por meio de Jesus Cristo,
de acordo com o beneplácito da sua vontade,
para que seja prestado louvor à glória da
sua graça,
que gratuitamente derramou sobre nós, no
seu Filho bem amado.
É em Cristo, pelo seu sangue, que temos a
redenção, o perdão dos pecados,
em virtude da riqueza da sua graça,
que Ele abundantemente derramou sobre
nós,
com toda a sabedoria e inteligência.
Manifestou-nos o mistério da sua vontade,
e o plano generoso que tinha estabelecido,
para conduzir os tempos à sua plenitude:
submeter tudo a Cristo,
reunindo nele o que há no céu e na terra.”
(Efésios 1, 3-10)
Galland, “Saul’s Conversion”
Traduzido e adaptado por
Ana Paula Barata